CONTOS DE SOLIDÃO - O choro do inocente
O parto foi muito
difícil. Joana sentiu contrações horríveis, e a dilatação alcançou seu ponto
máximo. O médico do SUS insistiu para que seu parto fosse normal. Ela sempre
quis ser mãe, todo mundo sabia disso! Olhava os três filhos da vizinha e
pensava que seu dia iria chegar. Só não esperava que aquele
"cachorro" do marido fosse se engraçar com a secretária, justamente
quando mais precisava dele, no oitavo mês de gravidez!...
E agora ela estava ali,
completamente sozinha, na sala de parto... Parecia um pesadelo, mas era a mais
pura realidade!
Involuntariamente, enquanto aguardava pelo obstetra de plantão, há uma hora atrás, lágrimas escorreram pelo seu rosto, que ela cobriu com as mãos. Finalmente chegou o médico, visivelmente contrariado por ter interrompido seu almoço de domingo com os amigos... Ele nem se sensibilizou com os olhos inchados da parturiente, nem com o desencanto de seu olhar. Quanto antes ele terminasse aquilo tudo, melhor para ele!...
A dor se tornou atroz,
a cabeça de Joana parecia que iria explodir, mas o médico mesmo assim optou
pelo parto normal. Um menino franzino finalmente nasceu chorando, frágil e
pedindo o aconchego da mãe, que desmaiou em seguida. Uma perigosa hemorragia a
manteria por mais uma semana no hospital público. Ela mal conseguia amamentar
aquele ser, tão magro e assustado, que parecia pressentir a insegurança de sua
situação.
Finalmente o médico
plantonista comunicou a alta, dez dias após o parto. A mãe e a tia a amparam na
saída, com olhares compadecidos. Era tudo o que ela não queria: aquele odioso
olhar de piedade estampado nos olhos da família!
Ao voltar para casa,
Joana olhou para seu filho e se sentiu impotente. Uma crise de choro se apossou
dela enquanto carregava nos braços aquele ser, que esperava por carinho e amor.
Subitamente, a rejeição ao menino veio com força total.
Sem entender direito o que estava fazendo, Joana pega o
bebê e o joga do 17º andar. A mãe e a tia gritam, desesperadas, mas nada mais
pode ser feito. O chorinho do inocente parou, pouco depois que seu corpo
encontrou a calçada. Uma multidão se reuniu estarrecida em volta daquele
corpinho já sem vida. E a PM bateu à sua porta, minutos depois.
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