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Mostrando postagens de maio, 2014

Os crimes anunciados

Toda a vez que a imagem do menino Bernardo aparece na mídia, a revolta das pessoas é unânime. Não há quem não se manifeste a favor de penas duras para o pai, o médico Leandro Boldrini, a madrasta, Graciele Ugulini, e a amiga dela, Edelvânia Wirganovicz, e o irmão, Evandro Wirganovicz, suspeitos de terem planejado e executado um dos crimes mais bárbaros dos últimos tempos no Brasil. Frases como “Que horror!”, “Coitadinho do menino!“, “Esses aí têm que apodrecer na cadeia!” e “Justiça contra os assassinos de Bernardo” são as mais comuns. O estudante gaúcho, que deu inúmeros sinais em vida de que estava sofrendo com a indiferença e o desprezo com que era tratado em casa, tentou desesperadamente que alguém o resgatasse, mas ninguém moveu uma palha sequer para salvá-lo. A empregada, parentes, vizinhos e amigos garantem que “não imaginavam” que um pai, que exerce uma profissão comprometida em salvar vidas, arquitetasse algo tão monstruoso. Se é que se pode chamar de “pai” e de “mé...

No Mundo da Lua - A barca - página 2 do Jornal do Vale do Itapocu, edição de 23.05.14

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A barca

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O dia mal amanheceu. A barca que conduzirá Ushiro está atracada na margem do rio. O jovem abraça longamente a mãe, que chora copiosamente à sua despedida. Ela sabia que um dia esse momento iria chegar, mas nunca se sentiu preparada. E agora Ushiro iniciaria a jornada para ir trabalhar em uma plantação de arroz no outro lado do país, onde as oportunidades eram melhores e havia a esperança de economizar e garantir o futuro, dele e da mãe viúva. Ali, naquele pedaço de terra isolado, não havia futuro para os jovens.  Kaneko lembra de como o filho era frágil, inseguro e assustadiço, de seus lindos e luminosos olhos. A introspecção e o porte orgulhoso sempre marcaram sua postura. E pensar que ele se achava feio e baixinho, para os padrões do lugar!, pensa a mãe, sorrindo.  Nas horas que antecederam a despedida, recordou com certa nostalgia das noites em claro que passou, do zelo que sempre teve para com ele, da extensa jornada de trabalho tecendo o algodão e a lã, dos sacrifícios pa...

A ilha e o iluminado

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Envolto em suas vestes rústicas de algodão, o venerável iluminado dividia com seus discípulos o pouco de arroz que havia sido trazido pelos visitantes do último verão. Os viajantes enfrentaram grandes dificuldades até encontrá-lo, em busca de um novo sentido para suas vidas. O rigoroso inverno fazia com que as poucas cabanas do vilarejo ficassem tomadas pela neve.  O vento soprava forte e o frio congelava o corpo até os ossos. Assim, uma tigela de arroz quente era uma dádiva que o mestre agradecia profundamente. Desde que havia sido exilado para esta inóspita ilha de Sado, na longínqua província de Niigata, ele sabia que sua vida não seria fácil. Mas aceitou o degredo com resignação. Aliás, sobreviver naquelas circunstâncias seria seu primeiro grande desafio, para depois cumprir sua missão espiritual, de transmitir para seus adeptos a essência do budismo: a benevolência. Desde o primeiro dia em que desembarcou na ilha, o monge tinha consciência de que precisava usar todos os ensina...

A emoção da Palhaça Dorothy

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A roupa e a maquiagem de palhaça há mais de um ano permaneceram guardadas, intactas. Porém, naquele domingo chuvoso, um motivo muito especial me fez decidir reviver a personagem. Eu iria participar de um evento beneficente em um asilo, promovido por um amigo muito especial, Henrique Leques, dos tempos do curso de manequim e modelo, em Porto Alegre, que hoje está à frente de uma das mais renomadas escolas de modelos da capital gaúcha. Em 2013, cheguei a participar do desfile beneficente, mas esse ano decidi mais uma vez dar vida à Palhaça Dorothy. Minha intenção não era mais me apresentar aos idosos que podiam assistir ao evento, mas sim, aos acamados, cadeirantes, solitários, deprimidos, que permaneciam nos alojamentos. Eu queria levar a alegria da personagem, espalhar sorrisos, deixar uma mensagem de esperança e de fé, olhar nos olhos, apertar as mãos e distribuir abraços aos que passavam os dias à espera de uma visita, de palavras, ou gestos de carinho. Imaginava que a iniciativa exi...

Diógenes encontrou a paz

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Todo mundo no escritório sabia que o doutor Diógenes Mourão era um homem inquieto. Não, ele não fez doutorado, é um homem de leis. Direito Trabalhista. Os colegas o enxergam como um “leão”, sempre que um funcionário se sente lesado e o procura para ser defendido. É um homem de bem, sem dúvida nenhuma. Idealista, desde pequeno queria ser advogado “para defender as pessoas”, dizia. E é justamente por ter um caráter ilibado e ser um homem essencialmente correto, que se irritava toda a vez que se deparava com as desigualdades do mundo. Era ético, acima de tudo. E olha que ele fazia de tudo para mudar essa condição! Até conseguia em muitos momentos. Ouvia música relaxante e acendia incenso em seu gabinete nos momentos mais tensos, como quando recebia um revés da parte contrária e seus clientes perdiam uma ação, injustamente. Além de tudo isso, praticava aulas semanais de ioga, se empenhava em aprender e lia, lia muito sobre a elevação espiritual. Revistas, livros, tudo o que estivesse...