CONTO - A estrada poeirenta
O relógio da sala toca as cinco badaladas e o
despertador toca poucos segundos depois. O dia ainda não amanheceu, mas a hora
é agora! Espicho os braços e as pernas, feito um felino por alguns instantes, e
em seguida dou um pulo da cama. Não há mais nenhum segundo a perder. Já adiei
demais esse momento. Ao lavar o rosto, me detenho um pouco na imagem refletida.
Estou pálido e com olheiras. E cadê aqueles olhos brilhantes, aquele sorriso
sempre pronto para se abrir?
Olho mais atentamente para mim mesmo e só vejo cansaço
e uma certa melancolia. Por que nem sempre o que se planeja na vida é o que
acontece? Por que a vida sai do nosso controle, às vezes? Por que algumas
decisões são tão difíceis de serem tomadas? Por que?!
Não, o espelho não vai me dar essas respostas... O
tempo talvez esclareça. O tempo... o misterioso tempo, envolto em brumas,
indecifrável... Coração aperta, os olhos marejam. Solto um longo suspiro,
ajusto o boné e reforço a minha decisão de partir.
Em seguida, me dirijo até a porta, pego o mochilão, a
sacola de mão com água, iogurte e o cream cracker. Vou ter que caminhar por
algum tempo até chegar à rodovia que me levará ao meu destino. Não há mais
tempo a perder! A hora é agora!
Apresso o passo e alcanço o portão. Os passarinhos
começam a cantar e a manhã vai clareando mais e mais. Caminho decidido mais alguns
metros e pronto: alcanço a estrada sinuosa. Lá ao longe vejo o trator do
vizinho vindo em minha direção. A movimentação no campo começava a se
intensificar.
Um cachorro magro atravessa na minha frente, pouco
antes do vizinho passar por mim, me cumprimentar com um sonoro “bom dia!” e
seguir em frente, levantando poeira... A estrada poeirenta se parece com os
meus pensamentos, turvos, que dificultam a minha visibilidade.
- Finalmente alcancei essa BR! O jeito vai ser caminhar
mais um pouco até o posto de gasolina. Lá vai ser mais fácil conseguir uma
carona até a fronteira. A essa hora, já se deram conta de que fui embora.
Melhor assim, sem despedidas...
Enquanto falava sozinho, sentia as minhas pernas
cansadas de tanto caminhar. Já são mais de 8h e o sol agora se abriu por
completo. Sinto calor e vou tirando a jaqueta enquanto me dirijo aos cerca de
500 metros que faltam até o posto. Estou com sede. Então pego a garrafa de água
mineral e começo a beber.
Olho em volta, caminhando às margens da BR, e vejo
caminhões, carros e motos correndo, de lá para cá e de cá para lá. Quantas
histórias estão se desenrolando agora! Cada um com sua trajetória... Solto mais
um suspiro. Anda, homem! Anda para frente, vai! Falta pouco para alcançar o
posto de combustíveis...
- Olá, amigo! Me dê uma média e uma coxinha, por
favor! Obrigado!
- Disponha...
- Escuta! Estou precisando de uma carona até a
fronteira. Você sabe de alguém que vai para o lado de lá? Estou vindo de
Arraial do Monte.
- Daqui a pouco passa o Juvenal aqui. Ele está
precisando de um “chapa”, quem sabe...
- Obrigado!
Decido esperar pelo tal Juvenal. O quanto antes sair
daqui, melhor. Quero começar uma vida nova...
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