Um conto cor-de-rosa

O relógio de parede do centro de imagem marcava 7h45. Sentada na confortável poltrona da sala de espera, os olhos de Maricéia discretamente percorrem o recinto e procuram traçar um perfil dos demais. Assim como ela, várias pessoas esperam para serem chamadas. Algumas procuram se distrair olhando o noticiário da televisão, outras ficam olhando o relógio, impacientes. Mas há também as que se mantêm com o olhar perdido, se fixando em um ponto da parede, ou no chão.

Ao escolher um dos bancos, Maricéia ficou de frente a duas mulheres que se comunicavam na linguagem dos sinais. Viu que ambas a olharam, curiosas.
-Será que está estampado na minha cara? Será que é tão visível o medo que sinto do resultado do exame? Devo estar impressionada com o caroço no seio esquerdo... Melhor não sofrer por antecipação! – pensou ela, desviando os maus pensamentos e dirigindo o olhar para o relógio. Estava quase na hora de ser chamada e a sua expectativa aumentava a cada minuto.

Por fim chegou o momento e a recepcionista a chamou.
- É agora! Seja o que for, vou enfrentar!, disse para si mesma, enquanto se dirigia para a sala onde eram feitas as mamografias.

Ao sair da sala de exames, Maricéia se dirigiu ao ponto de ônibus que à conduziria de volta para casa. Ao girar a chave da porta, sentiu algo estranho, uma espécie da mal-estar que não soube explicar de onde veio.
Vai direto para a cozinha. É quando enxerga um envelope no meio da mesa, deixado pelo marido: “Maricéia, me desculpe não ter esperado você chegar, mas achei melhor ir embora sem me despedir. Estou voltando para Rincão do Norte. Não dá mais pra mim. Procure as tuas amigas. Boa sorte. Miguel.”

Sem crer no que tinha acabado de ler, Maricéia se sentiu sem chão. Desabou a chorar por um bom tempo, até secarem as lágrimas. Depois ela levantou, foi lavar o rosto e se olhou no espelho por alguns minutos, tempo suficiente para o filme da sua vida ser projetado na sua frente. Aí ela decidiu reagir, depois de um longo suspiro.

Os olhos de Maricéia ainda estavam inchados quando ela decidiu sair e procurar as amigas para desabafar e trocar experiências. No caminho, uma linda rosa cor-de-rosa chamou sua atenção e acendeu uma “lâmpada”.
- É isso! Vou agora mesmo na Rede Feminina! Lá as minhas amigas vão me entender... Não importa o resultado do exame. Uma guerreira nunca depõe as armas sem lutar. Tenho certeza de que vou ser vitoriosa e ainda poder ajudar outras mulheres na mesma situação!, disse para si mesma, determinada a vencer.

Em seguida ela pegou delicadamente a rosa entre as mãos e a cheirou profundamente. O suave aroma da flor entrou por suas narinas e tomou conta de seu corpo e de sua alma. Apertou o passo. Estava decidida a chegar o quanto antes na sede da Rede Feminina de Combate ao Câncer. Sentia que podia ajudar muito a conscientizar outras mulheres durante o Outubro Rosa.



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