Conto - Nuvens da saudade

A primeira vez que Sofia ouviu falar sobre Mitologia Grega foi há muitos anos, quando recém tinha completado seis anos de idade. Ela nunca esqueceu a noite em que eu trouxe aquele livro grosso de capa dura, com ilustrações coloridas de deuses e deusas, semideuses, heróis e simples mortais, criados pela fértil imaginação dos habitantes da Grécia Antiga.

Supersticiosos e temerosos da fúria dos deuses, que eram vingativos e movidos a paixões, assim como os humanos, o povo grego vivia elevando suas orações e oferecendo sacrifícios para agradar as divindades do Olimpo.
Os olhos de Sofia brilhavam a cada episódio da obra, como a que contava sobre Ícaro, o homem que ousou desafiar o deus Apolo, único que podia se aproximar do astro-rei... Ficou com dó ao saber que as asas de cera e penas criadas por Ícaro, que sonhava voar como os pássaros, derreteram com a proximidade do sol e ele morreu... 

- Se aqui embaixo desse sol é um calorão, imagina lá em cima!


Sempre teve predileção por tudo que era relacionado ao universo celeste. Ela seria capaz de ficar horas e horas se encantando com a luz do luar e o brilho das estrelas...

No dia em que viu a imagem de Pégasos, o Cavalo Alado, os olhos de Sofia cintilaram!

- Um cavalo branco de asas que vive entre as estrelas! Ah se eu pudesse montar na garupa de Pégasos! Eu iria pedir que me levasse lá para cima, bem no alto!

Naquele mesmo dia, ela não descansou enquanto não achou um “Pégasos” na maior loja de brinquedos da cidade. Ao chegar em casa com o cavalo alado, foi logo pedindo algodão. Eu estranhei, mas atendi o pedido da minha filha, claro...

Depois de desmontar um rolo inteiro de algodão, transformando em tufos que lembravam nuvens, Sofia começou a brincar com o Pégasos. Pegou Hannah, a boneca-miniatura, e a colocou sentada e com as mãos nas asas do cavalo mitológico. Ela o fazia voar com Hannah por entre as nuvens, para lá e para cá... Perdeu a noção do tempo com a brincadeira, até que a chamei para dormir.

- Sofia, você não cansa de brincar com o Pégasos?, perguntei, com um sorriso.
- Ah só mais um pouquinho...

- Não, não, já chega por hoje, Sofia! Senão você não acorda amanhã...

No dia seguinte, ela me contou que ficou lembrando a brincadeira com Pégasos, Hannah, as nuvens de algodão... E imaginou a cena dela no lugar da boneca com o Pégasos “verdadeiro” galopando pelos ares. Disse que podia sentir a impetuosidade do cavalo alado, os movimentos vigorosos com as asas que ele fazia para se movimentar por entre as nuvens.

Ela se sentiu atravessando as nuvens, que tomavam as mais diversas formas, à medida que o voo evoluía. Ursas com filhotes, gatos e cachorros de várias raças, pássaros e fisionomias risonhas e carrancudas. Viu até uma bruxa de chapéu bicudo e fez uma careta, imagina!

De repente, a Sofia contou que Pégasos começou a descer rapidamente e as imagens se tornaram aceleradas, até que ela sentiu que caiu no solo. Foi quando ela caiu da cama, me acordou e me contou o sonho...




E hoje, tenho certeza que, onde quer que ela esteja, deve estar voando e brincando por entre as nuvens, como ela sempre sonhou, feliz... É assim que sempre quero lembrar da minha filha...

Comentários

  1. Oi, Sônia! Muito lindo e impactante teu conto.
    As lindas lembranças nunca morrem. E se mantém ( e nos mantém ) vivas, dentro dos nossos corações, como a luz do sol, brincando com sua magia ,na dimensão infinita das nubens! E como a Sofia costumava brincar, na sua imaginação!

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