Conto - O presente do ano novo chinês

Caminhar pelo bairro da Liberdade sempre foi um prazer inenarrável para mim. Aquela atmosfera mística, a decoração, as lojas e seus produtos importados, a exótica e saborosa culinária, tudo me faz voar na imaginação, rumo ao país do sol nascente e seus vizinhos. Made in Japan, Made in China, não importa, porque o meu encantamento desperta a cada vez que meus pés pisam por aquelas calçadas mágicas, que tem o poder de me fazer esquecer dos problemas e de tudo o mais...

Aqueles olhos puxados dos comerciantes, a fascinante diversidade de povos e raças que circula pela rua principal, as múltiplas barracas de artesanato, com peças gigantes até as mais surpreendentes miniaturas, têm o poder de me transportar ao outro lado do globo. Dragões assustadores, luminárias, artigos de bambu, velas, incensos, roupas, plantas...  Não importa quantas vezes eu passe por lá, a sensação é sempre de primeira vez...

- Ok, Mirella, tudo isso já sei faz tempo... Mas o que aconteceu naquele dia?

Ah, naquele dia, algo diferente se anunciava. Eu estava andando, atenta às vitrines, buscando mais um objeto decorativo, mas sem muita grana para gastar... Notei que a movimentação estava mais frenética naquela manhã. Logo lembrei: eram as comemorações do ano novo chinês, que iniciaram dia 19 de fevereiro! Ingressamos no Ano da Cabra! Saiu o Ano do Cavalo, galopante, impulsivo e turbulento...

- E o que isso quer dizer, afinal?

Diz o horóscopo milenar chinês que o ano da Cabra promove profundas transformações, os ânimos serenam, os bons sentimentos afloram e a época é propícia para a criatividade e as manifestações artísticas... Eu olhava aquela festa toda, as roupas típicas, os tambores, a música e as coreografias que saudavam a virada do ano chinês e me lembrava dos filmes do Jackie Chan...

Naquele momento, a esperança se instalou em mim. Lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto sem que eu percebesse, mas eram de alegria interior...

- E o que foi que te marcou tanto, naquele dia?

No instante em que percebi que as minhas lágrimas estavam caindo durante a cerimônia, uma menina comuns seis na os de idade apareceu e veio em minha direção. Se aproximou de mim com roupas ancestrais, sorriu e me entregou uma caixinha de madeira cuidadosamente revestida com seda vermelha e circundada com um perfeito laço de fita cor de ouro.

Surpresa com o gesto da menina, passei a abrir a caixa devagarinho. Era um bibelô dourado de porcelana em formato de cabra! Agradecida com a gentileza do gesto, dirijo os olhos novamente para a menina, mas ela tinha sumido! Perguntei para as pessoas à volta se tinham encontrado uma garota com traços chineses naqueles trajes, mas todos me olhavam com estranheza... Ninguém a tinha visto em lugar nenhum...

Voltei para casa e deixei o presente em cima da mesa. Antes de dormir, ao retirar a cabra dourada, notei que a caixa tinha um fundo falso, abri e encontrei um papel com os dizeres: “Happy chinese new year! Believe in yourself!” (Feliz ano novo chinês! Acredite em você mesma!).
Naquela noite, durante o meu sono, revi a imagem da cativante menina chinesa sorrindo novamente para mim, abanando em despedida.



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