Conto - Uma segunda chance
A cabeça de Norton latejava tanto que parecia
que iria estourar. Suas mãos tremiam e seu olhar estava perdido no infinito.
Mil imagens apareciam e desapareciam em sua mente. O coração quase saltava pela
boca, de tanto que ele correu. A camisa estava ensopada de suor e as ideias
desconexas.
A noite escura foi aliada fuga, e o parque
parecia ser o lugar ideal para colocar a cabeça no lugar. Naquele momento, o
lago de águas serenas apareceu como um bálsamo.
Sentou à beira do lago para entender o que
aconteceu. Como tinha sido capaz de tanta insanidade? Como pode perder o
controle? Lágrimas copiosas começam a cair. Sacudido pelos soluços, o jovem
esconde o rosto entre as mãos e fala baixinho, como a sussurrar para si mesmo:
E agora?!...
A noite pareceu interminável, até que a luz do
dia iniciou o lento desvendar da escuridão, tornando as formas mais nítidas e o
lago mais azul. O parque pouco a pouco
descortinava seus habitantes, de mendigos e andarilhos, que pareciam se
assustar com a chegada dos raios solares. Alguns ainda dormiam, sucumbidos pelo
sono, ou pela cachaça da noite anterior. Outros se esforçam para levantar, e,
ainda trôpegos, procuram coordenar as pernas.
Nenhum dos excluídos aparentava se importar com
a presença de Norton, que permaneceu sentado em frente ao lago, olhando para o
nada. As profundas olheiras denunciavam uma noite em claro.
Ainda lembrava do olhar incrédulo da mulher
quando disparou quatro tiros à queima-roupa no seu peito, dos gritos de dor e
desespero, do pedido em vão de socorro. Mas o sítio era um lugar isolado, sem
nenhum vizinho por perto para acudir.
- O que é que eu fiz?!, se perguntava, enquanto
soluçava e suas mãos pareciam querer arrancar os próprios cabelos, completamente
transtornado.
Pouco depois, Norton se levantou e olhou o lago
como se fosse pela primeira vez. Aquele azul profundo parecia hipnotizá-lo.Foi
quando ele começou lentamente a entrar na água, sem se importar que estava
afundando mais e mais, até desaparecer por completo.
Uma sirene da Polícia se aproxima e os
policiais rapidamente se jogam na água para resgatar o fugitivo. Depois de
tossir, ele expele a água e é levado à delegacia, sem resistência. Estava
devastado.
Foram 15 longos anos de condenação até
ultrapassar os portões de ferro da penitenciária. Mal acreditava que estava
saindo vivo dali. Começou a descer a rua e a reparar nos prédios novos. Algumas
casas mostravam a ação inexorável do tempo. Tudo estava muito diferente.
De mochila nas costas e com uma modesta quantia
em dinheiro, economizado na produção de grampos de roupas, quando passou a
deduzir um dia da pena a cada três trabalhados, se dirigiu à parada de ônibus. Ninguém
ali o reconhecia com aqueles cabelos grisalhos e as profundas rugas da face, e
isso o tranquilizou. O ônibus parou e ele se dirigiu à rodoviária.
- E o senhor? Vai pra onde?, perguntou o
atendente do guichê de passagens.
Norton já tinha olhado o painel e decidido seu
destino. Queria um lugar bem longe, que nunca tinha colocado os pés.
-
Itamirim do Norte!
Ao subir no ônibus, deu uma última olhada para
trás, se despedindo do passado. Uma lágrima caiu e ele soltou um suspiro.
Estava recebendo uma segunda chance e não pretendia desperdiçar.
Crédito da foto: Estrada reta - Freepik - Foto gratuita
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