Sonho de bailarina
O grande sonho de Marieta sempre foi ser uma bailarina. E isso desde pequeninha. Ela ficava encantada quando via as apresentações de balé na televisão P&B. Imitava os passos, os giros, os rodopios no palco e se deixava embalar pela melodia clássica. Ah, como ela queria usar aquela malha de dançarina, a meia branca e as delicadas sapatilhas!
Quando Marietinha
passava por uma vitrine de presentes, ficava encantada com as caixinhas de
música, especialmente com as que tinham aquela boneca minúscula, que bailava
sem parar a um simples movimento de dar corda.
Durante o
sono, muitas vezes a lúdica imaginação de menina a conduzia a um palco
iluminado, onde ela bailava, bailava e, ao final da apresentação, se emocionava
com os aplausos da plateia.
Certo dia,
ao acompanhar a mãe, Veridiana, ao clube do bairro, Marieta abriu uma das salas
e encontrou um grupo de meninas na aula de balé e ficou deslumbrada. Ao ser
descoberta pela professora, corou, se desculpou e fechou a porta. Foi correndo
procurar a mãe para contar a novidade.
- Mãe! Tem
aula de balé aqui! Eu quero fazer balé também!
- Marieta,
vamos falar com o teu pai primeiro...
Os olhos de
Marieta brilharam de esperança. Mas a alegria durou pouco. O pai, João, que
recebia um modesto salário trabalhando na indústria, ficou com o semblante
triste. A colocou no colo e explicou que haviam muitas despesas para arcar. Que
ele sentia muito, mas naquele momento não tinha condições de realizar o sonho
da filha. Argumentou que não dispunha de recursos suficientes para bancar as
aulas e tudo o mais que envolvia para mantê-la em uma companhia de dança.
Os olhos de
Marieta se encheram de lágrimas. Irritada com a negativa, foi para o quarto e
bateu a porta, dizendo que nunca mais queria falar com o pai.
Desolado,
João, soltou um longo suspiro. Como explicar para a filha, de apenas cinco
anos, que além do aluguel do apartamento onde moravam e todas as demais despesas
para manter a família, ainda pagava a prestação da casa própria?
Os anos
foram passando e o sonho de bailarina de Marieta ficou para trás, em algum
canto da memória. Os estudos, a carreira, a vida, enfim, tudo seguiu em frente.
Como mãe, e
mais tarde como avó, Marieta viu o sonho de criança se realizar naquela tarde
de dezembro. Ao buscar a neta Luana, deslumbrante no traje azul de bailarina, o
tule esvoaçante, com maquiagem luminosa, tiara de princesa e a sapatilha de
cetim, a alegria não coube no peito! E quando as cortinas do palco da Sociedade
Cultura Artística se abriram e ela entrou saltitante, com movimentos leves e
graciosos, Marieta não conseguiu segurar as lágrimas. Abanava para ela, se
jogava para frente da cadeira, mesmo sabendo que a neta não tinha como a
enxergar do palco. Ali estava Luana, tão pequena, linda, radiante, realizando o
sonho de bailarina! Era como se Marieta também estivesse realizando o seu
próprio sonho, finalmente descortinado depois de décadas.
*Conto inspirado na apresentação de balé da minha neta, Luna. Publicado na minha coluna aos domingos no JDV Online, em 18 de dezembro de 2022.
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